terça-feira, abril 14, 2009

Dia

Virginia,

Não nos podemos perder das palavras. São a nossa carne, o nosso fluido, o nosso amor. Porque nada do que importa se escreve em palavras certas, mas há a ingenuidade e o sonho de quem o tenta que não se pode perder. Temos os nossos dias, Virginia, temos o pé à frente do outro, os olhos nos cartazes da rua, o cheiro do chá de frutas, o toque da pele, o lábio no copo, o ouvido atento ao chiar da cidade. Há tudo isto, sim, e há a vida onde se encontram para se fundirem num ninho de almas, mas há mais.

Sabes, minha irmã, os dias prosseguem. Hoje deito-me, sem forças nas pernas, perdi sangue, perdi tempo, perdi paciência e perdi chamadas. Arrumo depressa todas as horas gastas na primeira gaveta da mesa de cabeceira, mesmo que não ignore o facto de nunca mais as poder desarrumar, e morro para este dia. Desligo deste espaço, mergulho naquele surrealismo nocturno de que tantas vezes não nos recordamos, e espero pelo despertar ensonado de amanhã. E já não existe este dia. Perdeu-se naquela gaveta funda e cruel. Virginia, não me deixes viver apenas aqui.

Faltam-me as palavras. Enquanto te escrevo, o corpo arde-me. Arde-me o peito, amoroso e enternecido por me ter recordado dele. Ardem-me os membros pelo uso que lhes dou. Tenho o corpo feliz por o ter desperto para ti, de novo. Não me deixa parar.

Onde foi que nos esquecemos das nossas palavras, my dear? Volta para o nosso universo, comigo. Somos feitas de palavras quentes e firmes, de longas conversas de fim de noite. Somos feitas de tanto. Escreve-nos, Virginia. Escreve-me de volta.

1 Comments:

Anonymous Urizen said...

Ela contém uma pátria em ci que alimenta o fervor da devoção. Para ela convergem leais devotos da plenitude. O símbolo guardado pela alquimia do ser, aguarda o nascer do sol para se vivificar. Parabéns pelo blog desibernado ^^

12 de maio de 2009 às 15:22  

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